No Hospital João XXIII, da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), um dos maiores prontos-socorros do país, referência nacional na atenção ao politrauma, os acidentes de trânsito representam a maior parte dos atendimentos realizados. No período de 2011 a 2020, 66.404 pessoas entraram no setor de politraumatizados da unidade hospitalar devido a esse tipo de ocorrência. A maioria (59,50%) pilotava uma motocicleta.

Em 2021, outras 7.211 pessoas foram atendidas, das quais 66,49% (4.795) eram motociclistas. Neste ano, já são mais de 2 mil entradas e os acidentes com motos seguem como o principal motivo (67,46%).

Jovens

Outro dado que chama a atenção é que 32,09% dos atendimentos realizados no João XXIII, motivados pelos acidentes de trânsito, envolvem jovens com idades entre 20 e 30 anos. O número – um terço dos registros – reúne motociclistas, pedestres e condutores de automóveis de passeio.

Daniela Fóscolo, cirurgiã do trauma e gerente médica do Complexo de Urgência e Emergência da Rede Fhemig conta que a única vez que percebeu uma diminuição do número de atendimentos a acidentes de trânsito no hospital foi no início da “lei seca”, em 2008.

A percepção da médica é confirmada pelos dados do estudo “O impacto da Lei Seca sobre o beber e dirigir em Belo Horizonte” que mostrou que, no ano em que a ‘lei seca’ passou a valer, houve queda de 50% no número de pessoas dirigindo com algum nível de álcool no organismo. No entanto, desde então, os acidentes de trânsito seguem sua trajetória de crescimento.

Conscientização

Para o cirurgião geral e gerente assistencial do Complexo de Urgência e Emergência, Rodrigo Muzzi, o caminho para uma possível mudança de cenário é a conscientização para a importância da direção segura e da educação no trânsito. “Cada um deve ter consciência de que a segurança dele e dos demais depende do seu cuidado e atenção ao dirigir”, pondera.

Segundo Muzzi, o tempo de internação das vítimas de acidentes de trânsito é bastante variável e depende do tipo de lesão. De modo geral, se não houver lesão grave, o paciente costuma ficar no pronto-socorro por algumas horas. Caso haja fratura de membros, esse tempo sobe para sete dias (fraturas simples) a um mês (fraturas complexas), com possibilidade de sequelas. Quando há lesão cerebral grave, o paciente pode ficar internado por mais de 30 dias.

“O problema é que, especialmente, o motociclista está sujeito a lesões de maior gravidade, quando comparado aos demais motoristas, que estão protegidos pela carcaça do veículo que dirigem”, completa Fóscolo.

No pronto-socorro do Hospital Regional Antônio Dias (HRAD), também da Rede Fhemig, localizado em Patos de Minas, no Alto Paranaíba, o cirurgião geral Carell Peres Marra constata, em sua rotina de atendimentos, que os níveis de gravidade dos acidentes de trânsito ocorridos na região, principalmente envolvendo motocicletas, variam de moderado a grave. “Geralmente, são homens jovens e tendem a ter uma gravidade maior. Não é infrequente pacientes atropelados”, ressalta o médico. Segundo ele, a prevenção é sempre o melhor caminho. “A maioria dos acidentes ocorre por excesso de velocidade ou uso de álcool”.

Problema mundial

A situação, que se repete nas grandes cidades do país e do mundo, constitui um grave problema de saúde pública – que reduz a expectativa de vida de indivíduos jovens e gera incapacidades que comprometem o desempenho pessoal e profissional de gerações de homens e mulheres. O problema é tão sério que mobiliza autoridades e instituições em todo o mundo para mudar esse cenário até 2030.

O esforço conjunto apresenta dois projetos principais que se complementam: a 2ª Década de Ação pela Segurança no Trânsito 2021-2030, instituída pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela Organização das Nações Unidas (ONU), e o Maio Amarelo, que nasceu com a 1ª Década de Ação pela Segurança no Trânsito (2011-2020) e que traz, neste ano, o tema “Juntos salvamos vidas!”.

Ambos buscam reduzir pela metade o número de mortes e lesões decorrentes de acidentes de trânsito até 2030. A meta é uma prioridade econômica e social para a OMS que defende, ainda, o investimento na segurança rodoviária devido ao seu impacto positivo na saúde pública e na economia.

De acordo com a OMS, os acidentes de trânsito são a principal causa de morte para crianças e jovens entre 15 e 29 anos em todo o mundo e uma das principais causas de morte e ferimentos globalmente. São mais de 1,35 milhão de óbitos e cerca de 50 milhões de feridos por ano, a maioria (90%) em países em desenvolvimento.

No Brasil, a primeira década de ações teve como resultado a queda de quase 30% no número de mortes relacionadas a acidentes de trânsito. De modo geral, os objetivos da primeira década não foram alcançados por nenhum dos mais de cem países participantes.

Fonte: Agência Minas