O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu nesta quarta-feira (18), por unanimidade, que é obrigação dos poderes públicos a oferta de transporte público gratuito em áreas urbanas nos dias de eleição. A decisão acolhe o posicionamento da Procuradoria-Geral da República (PGR) que, em parecer e sustentação oral durante a sessão plenária, defendeu a obrigatoriedade de o poder público promover as condições mínimas que viabilizem o exercício do voto, expressão máxima da soberania popular. A decisão ocorreu na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1.013/DF, proposta pelo partido Rede Sustentabilidade.
De acordo com a tese fixada, a disponibilidade do transporte gratuito deverá ocorrer em frequência compatível com aquela ofertada em dias úteis. Para a PGR, a medida estimula o exercício pleno da democracia e afasta possível contexto de exclusão de porção da sociedade mais vulnerabilizada. “Em uma sociedade tão desigual economicamente, o ato de votar, mesmo obrigatório, há de ser apoiado e estimulado pelo poder público”, sustentou a vice-procuradora-geral da República, Ana Borges Coêlho Santos, durante a sessão plenária.
Ela argumentou ainda que o ato de votar, para muitos, é uma ação onerosa, em que muitas vezes o custo de deslocamento até a sessão eleitoral supera o da multa pelo não comparecimento às urnas. “A promoção da gratuidade do transporte público, mais do que contribuir para a inclusão de todos no processo democrático, afasta o contexto de marginalização política dos grupos menos favorecidos economicamente, alijados do processo eleitoral pela falta de condições materiais de transporte”, pontuou.
Os poderes constituídos têm a obrigação de garantir os meios mais facilitados possíveis para que o processo eleitoral transcorra sem obstáculos, defendeu a vice-PGR. Segundo ela, a atuação estatal nesse sentido é uma imposição do seu dever de sempre buscar a legitimação popular. “Há aqui dever de Estado de ofertar e custear o serviço público essencial de transporte que, mesmo quando delegado à iniciativa privada, é de sua responsabilidade”, aponta.
A vice-PGR citou como exemplos os benefícios concedidos pela Lei 6.091/1974, que estabeleceu direito a transporte público gratuito em áreas rurais, bem como pela Resolução 23.669/2021 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que estendeu o benefício a populações indígenas e remanescentes de quilombos nos períodos eleitorais. Para ela, o mesmo benefício deve ser aplicado às populações de áreas metropolitanas, dado o crescimento das cidades. “No cenário atual de afastamento físico cada vez maior da periferia, também eleitores no contexto urbano dependem da oferta ampla e gratuita de transporte público em dia de eleição para o pleno exercício de sua cidadania”, pontua.
Em sua fala, Ana Borges enfatizou, ainda, o papel democrático e legitimador do voto, que chancela o poder do Estado por meio da escolha popular de seus representantes. Para ela, assegurar, no máximo grau possível, que esse direito seja exercido por todos os brasileiros, em igualdade de condições, é forma de garantir a força da própria democracia. “Quanto maior a representatividade do povo nos ambientes de poder, mais sólido se mostra o regime político”, ponderou.
A decisão gera efeitos a partir do pleito de 2024, caso nenhuma lei sobre a questão seja elaborada pelo Poder Legislativo. Em caso de omissão legislativa, a Suprema Corte determinou ainda que o tema será regulamentado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).